Mãe, porque sempre

Tenho paz enquanto tiver os teus ombros para me agarrar o mundo.

Pensei em escrever-te isto, mas pareceu-me pouco para o tudo em que me vives. Como se pode escrever tudo o que me és sem que fique tudo por escrever-te?

Sou coragem enquanto existir o teu colo para me defender do medo.

Pensei em falar-te isto, mas soou-me pequeno para o tamanho que me ocupas. Como posso falar tudo o que te tenho sem que fique tudo por falar-te? As palavras não chegam e quando chegam não bastam. Há mais, mãe. Há mais no que me és do que alguma vez seria capaz de escrever. Há um espaço enorme para o que te tenho e vocabulário insuficiente para o preencher. Fizeste-me homem e com isso cresceu-me um sem fim de gratidão, misturado com um imenso céu de sorte. Porque tu, mãe. Porque única, mãe.

Ensinaste-me a ser, a ir para onde o sorriso for maior e a sonhar sempre que houver a possibilidade do sonho. Disseste-me que havia a perda também, que a terra é mais áspera onde a desilusão nos ganha. Mas há sempre a esperança, há sempre mais um dia, mais um sorriso, mais um sonho, mais uma mão tua a segurar a minha. Por isso, hoje sou um lugar de carne, osso, sorrisos e sonhos, erguidos pelas tuas mãos que seguram as minhas. Mas há, por vezes também, recantos inóspitos a eclodir de dentro. E os olhos são, por vezes também, miradouros para as fissuras todas de tudo o que fui e de tudo o que podia ter sido.

Peço perdão pelo que falhei, quando quis ser mais e fui menos. Quando fui de olhos fechados para o abismo do erro. E chorei, mãe. Chorei pelo erro, pela dor, por não conseguir ser-te esse amor todo na tua mão. É impossível tanto amor numa mão apenas. Falhei-me. E, de todas as vezes, falhei-te também. Sei agora que não há dor maior que uma mãe que nos chora, mas, por vezes, é preciso ir sozinho, cair sozinho e doer sozinho. Para depois ter as tuas mãos a segurarem-me a dor. Porque, tenho a certeza, enquanto tiver as tuas mãos nunca hei-de doer sozinho. Porque o amor, mãe. Porque és, mãe.

Mas queria que soubesses que em tudo o que fui, em tudo o que podia ter sido e em tudo o que serei, fui e serei porque foste e serás comigo. Porque és comigo, como sou contigo, desde o ventre até para sempre. Feito para te ser filho, neste sítio coberto pela vastidão do que me pertences, assim como te pertenço. Um, num infinito onde as palavras são escassas, onde a língua é um limite de expressão.

E a verdade é que a verdade inteira não cabe neste texto inútil. As palavras são finitas para o quanto as mães têm de eterno. E uma parte da verdade inteira é que todas as mães deviam ser eternas. Acho que alguém já disse isto antes. E se ninguém o disse, está dito agora. E mesmo que pareça pouco, mesmo que soe pequeno, quero que saibas que sou inteiro, que sou gigante, enquanto encontrar os teus braços para me amparar a vida. Vá para onde for, o cordão estica e não parte, vás para onde fores. Porque me és, mãe. Porque te sou, mãe.

E raios partam o tempo que leva tudo o que nos pertence. Raios partam a morte. Que sejas tu a prova viva de que a mortalidade é um mito. Todas as mães deviam ser a prova viva de que a morte é um mito. Promete-me que não morres nunca, mãe. Prometes-me, mãe? Mesmo que os pulsos te cedam e a filha da puta da morte te arranque daqui, prometo-te que vou continuar a segurar a tua mão, mãe. Prometo-te, mãe. Com a mesma esperança num novo dia, com o mesmo amor impossível. Porque a verdade inteira é que todas as mães carregam a eternidade no ventre. Porque a vida, mãe. Porque sempre, mãe.

maeporquesempre_obohemio

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