Duas pernas que tremem

É quando as tuas pernas tremem que sabes que vale a pena.

Casei-me contigo no dia em que te vi pela primeira vez e as minhas pernas tremeram. Foi aí que soube que serias a mulher de todas as vidas que possa vir a ter. Desculpa se parece algo precipitado, mas saber que existes e não me despenhar nos teus braços parece-me um precipício maior. E é por isso que estou aqui agora, tinha que dizer-te que há duas pernas que tremem. Tinha que dizer-te que há duas vidas que existem para serem partilhadas. Tinha que dizer-te que o amor são duas pernas a tremer, num abalo do tamanho da certeza que afinal existe o teu abraço. Era isto que estava a tentar dizer-te até sermos interrompidos pelo padre no dia em que me casei contigo.

Preciso dizer-te que desde que te vi pela primeira vez, há duas vidas que estremecem para serem duas numa só: a que tenho sem ti e a que quero ter contigo. De cada vez que apareces, há uma energia tectónica que desloca todas as partes de mim, num movimento convergente com todas as partes de ti. Como se fossemos dois pedaços de terra numa rota de colisão, com algo dentro que nos empurra para a junção. Desculpa se parece despropositado, mas ter-te nos pulsos e não ter os teus olhos todas as manhãs, ora aí está um despropósito maior.

De resto, tinha que dizer-te que o mundo treme sempre que te penso. E é porque treme que sei que vale a pena. É porque as pernas cedem que sei que a única cedência possível é a do espaço que vai do nunca ao para sempre. Como se mede essa distância? Nas pernas que balançam e não avançam, nos passos que se querem e não se dão. A maior distância entre duas pessoas que se querem é a soma das pernas que não avançam e dos passos que não se dão. Eu e tu estávamos à distância de duas pernas a tremer e dois pés imóveis. Eramos apenas duas vidas singulares a desejar o plural. Agora, o padre já se calou e somos, finalmente, duas vidas singulares a beijar o plural. Há abanões na terra que parecem caídos do céu. Agora já sei que duas pernas a tremer são tudo o que precisas para viver e nem a morte é capaz de separar duas vidas que se abraçam.

Era isto tudo que queria dizer-te e um dia ainda paro de escrever isto tudo e digo-te. Até lá, somos duas ilhas separadas por duas pernas que tremem, prisioneiros dos passos que não se dão.

 

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